Atualmente, a indústria automóvel é um negócio global. Mas nem sempre foi assim. Em 1989, o mapa do mundo era completamente diferente, com grande parte da Europa de Leste a definhar atrás da Cortina de Ferro. Em novembro desse ano, o Muro de Berlim caiu, dando início a uma cadeia de acontecimentos que acabou por significar o fim da União Soviética.
Nos anos que se seguiram, habituámos-nos a que muitos bons modelos fossem desenvolvidos e fabricados na Europa de Leste. Mas, antes de 1989, não era bem assim. Neste artigo olhamos para o passado, para algumas das contribuições menos célebres do Bloco de Leste para a história automóvel e que alguns de nós recordamos com mais ou menos saudosismo.
Yugo 45 (Jugoslávia)
A mais recente contribuição da região dos Balcãs para a indústria automóvel mundial é impressionante, chama-se Rimac, veio da Croácia e estabeleceu uma série de recordes com o seu hipercarro elétrico Nevera de 256 km/h. Nos anos setenta, a Croácia era uma das partes constituintes da Jugoslávia, um super-Estado eslavo que mostrou ao mundo o Yugo 45.
Produzido pela Zastava na Sérvia, esta versão mais pequena do Fiat 127 tinha um motor de 44 CV e era propensa à ferrugem. Foram feitas tentativas de venda em vários países da Europa ocidental mas com pouco sucesso, e até houve um esforço para injetar algum glamour com uma versão cabrio.
Trabant (Alemanha de Leste)
Os passeios de Trabant, que se tornaram uma parte divertida das visitas a Berlim, são uma ilustração viva de que o carro da Alemanha de Leste para as massas é um verdadeiro símbolo da antiga República Democrática Alemã, tal como o famoso muro da cidade. Mas não se deixe enganar pela nostalgia. O Trabant, apresentado pela primeira vez em 1957, era um veículo muito primitivo, com um motor a dois tempos pouco potente e um chassis monobloco que imprimia um comportamento dinâmico pouco preciso. A carroçaria era feita de Duroplast – um plástico de resina composta que era inovador para a época – mas não possuía sequer elementos básicos como um indicador de combustível ou cintos de segurança. O modelo foi vendido durante décadas e, em 1989, foram construídos 150.000 exemplares, uma vez que a procura se manteve elevada. Mas quando a unificação alemã foi acordada em outubro de 1990, o fim do Trabi aproximou-se – sobretudo devido às suas terríveis emissões, que não se coadunavam com aquilo que se passava no Ocidente.
Lada Niva (União Soviética)
Lançado pela primeira vez há 47 anos, em 1977, o Lada Niva é um todo-o-terreno puro e duro que continua a ser fabricado, tendo seguido o seu próprio caminho singular e recusando-se a seguir a moda automóvel. Foi vendido oficialmente em Portugal nos anos oitenta e noventa, e ainda é vendido em alguns países a nível mundial com pequenos restyling que pouco ou nada mudaram o Niva. O aspeto clássico e a construção monocoque que o dotou de uma genuína capacidade todo-o-terreno podem levar alguns românticos de olhos enevoados a recordá-lo com mais carinho do que merece. No entanto, não tem muito mais a recomendar do que o seu baixo preço e uma atualização recente que permitiu cumprir os regulamentos de emissões Euro 5.
FSO Polonez (Polónia)
Um Fiat polaco readaptado foi o FSO Polonez, que foi lançado em 1979 com um chassis e motores da então antiga berlina Polski Fiat 125p. Notavelmente, havia alguns nomes famosos ligados a este projeto, com a lenda do design Giorgetto Giugiaro e o ex-chefe de design do Grupo VW, Walter de Silva, supostamente envolvidos na criação da sua carroçaria hatchback. Mas pouco mais havia de moderno no Polonez, que não conseguia disfarçar as suas bases pré-históricas, ainda que o espaço no habitáculo fosse digno de modelos de segmentos superiores. No Ocidente as vendas foram baixas para um carro que se sentia décadas atrás dos seus rivais desenvolvidos.
Dacia 1310/Denem (Roménia)
Estamos agora habituados a que os automóveis Dacia figurem entre os mais vendidos em vários países da Europa, com os compradores a adorarem os modelos que se destacam pela excelente relação preço/qualidade/equipamento. Mas os veículos romenos nem sempre foram tão apreciados. Um exemplo foi o familiar Dacia Denem, trazido para a Europa em 1983 como um Dacia 1310 rebadged. O 1310, e o seu antecessor 1300, tinham raízes no Renault 12 de 1969. Como qualquer carro do leste, a qualidade de construção era questionável. O 1300 e o 1310 deram mobilidade a milhões de romenos, mas estavam muito aquém dos automóveis ocidentais da época.
Wartburg 353 (Alemanha de Leste)
Também da RDA, mas não tão famoso como o Trabant – ou notório, dependendo do ponto de vista – foi o Wartburg 353, um carro familiar espaçoso mas espartano que fez a sua estreia em meados dos anos sessenta. Tal como a maioria dos modelos aqui apresentados, foi produzido e vendido a baixo preço, dada a relativa falta de recursos disponíveis atrás da Cortina de Ferro. Cerca de 1,2 milhões de exemplares foram produzidos entre 1966 e 1988, e teve sucesso na Hungria, Polónia e Bulgária, bem como na Alemanha. Existia também em carroçaria station wagon. O 353 foi mesmo trazido para Portugal, e foi promovido com imagens que o retratavam no exterior das Casas do Parlamento. Mas as preocupações com as elevadas emissões do seu motor de três cilindros a dois tempos de 991 cc, levaram à suspensão das vendas passados poucos anos.
Polski Fiat 126p (Polónia)
O Polski Fiat 126p era quase idêntico ao 126 da marca italiana e foi construído sob licença pela Fabryka Samochodow Malolitrazowych da Polónia a partir de 1973 e durante 27 anos.
O preço baixo fez com que o pequeno carro de 23 CV fosse um enorme sucesso na Polónia, onde foram fabricados mais de 2,6 milhões de unidades – incluindo na fábrica em Tychy – onde hoje se produz o Jeep Avenger – e se tornou um verdadeiro ícone cultural, embora, mais uma vez, com tendência para enferrujar. Não se vendeu por cá. Um dos famosos fãs ocidentais é o ator Tom Hanks, que foi presenteado com um modelo por uma cidade polaca, depois de ter partilhado o seu entusiasmo nas redes sociais.
Skoda Estelle (Checoslováquia)
Avaliar os automóveis da Skoda antes da entrada no Grupo Volkswagen, decorria o ano de 1991 não é tão simples atualmente, eram também superiores a alguns dos outros carros aqui apresentados. Considere-se o Estelle (conhecido como 105, 120 e 125 noutros locais), um pequeno automóvel familiar com motor traseiro e tração traseira que “viveu” entre 1977 e 1990. Apesar de estar longe de ser desejável, era barato, fácil de manter e robusto, tal como ilustrado por uma série de sucessos em ralis. Embora o Estelle não fosse tão apelativo como o atual Kodiaq, por exemplo, outros carros mereciam ser igualmente fiáveis.