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Thomas Hilse é um homem de objetivos. A liderança da Iveco não lhe tirou a humildade, mas deu-lhe uma nova perspetiva do mundo. Com a pandemia que vivemos um pouco por todo o mundo, as empresas vão precisar de se reinventar. Garante que, para isso, a marca italiana está no bom caminho.

A Revista Comerciais & Pesados esteve à conversa com Thomas Hilse, o presidente da Iveco, que nos deu uma perspetiva da marca em tempos de coronavirus e ainda uma visão de presente e de futuro da marca. O objetivo é combater esta pandemia com trabalho e com produtos que serão lançados até final deste ano. Falou também da parceria com a Nikola e do que espera deste acordo, celebrado no final de 2019 com pompa e circunstância.

  1. – Comerciais & Pesados (C&P) – Como está a transição da estratégia Transform2Win da CNH Industrial para a realidade? O que vão implementar primeiro? Como, em termos práticos, está a Iveco a preparar-se 2021?

Thomas Hilse (TH)  – O mais importante é que a estratégia para a mudança se mantém válida, nada mudou para além da situação sem precedentes em que nos encontramos. O nosso objetivo é a longo prazo. É claro que vão existir alguma mudanças em termos de “timings” para aquilo que temos previsto, mas os principais objetivos não vão ser alterados. Estamos definitivamente no caminho certo com todas as atividades que temos previstas a avançarem.

A CNH Industrial tem vindo a preparar-se para a reviravolta e a trabalhar no “design” do novo negócio, nas suas estruturas e processos. Devido à situação que vivemos, o nosso principal foco mudou temporariamente para a gestão da crise, mas a estratégia permance sem alterações e estamos a implementá-la.

Do ponto de vista da Iveco, o conceito Transform2Win não mudou. A evolução do nosso portfolio de produtos está a mover-se rapidamente. O que alcançamos num só ano é fantástico:

  • Em abril de 2019 lançamos o novo Daily, ou seja pegamos num veículo que já era bom e tornámo-lo melhor ainda, com sistemas avançados de ajuda à condução e conetividade.
  • Em julho do ano passado, lançamos o Iveco S-WAY, que na minha opinião surpreendeu a indústria dos pesados e os nossos clientes. É um veículo desenhado em torno das necessidades dos clientes e o “feedback” tem sido extremamente positivo.
  • No final de 2019, anunciámos a parceria com a Nikola para o hidrogénio e camiões elétricos. Mais uma vez acho que voltamos a surpreender a indústria com este passo e com a velocidade com que o concretizamos. Três meses depois de termos assinado o acordo, apresentamos um concept.
  • E ainda há mais para vir no final de 2020, quando lançarmos o Iveco T-WAY, o nosso camião de obras e estaleiros e successor do Trakker.
  • Assim, no final do ano, teremos uma gama de produtos totalmente reformulada em todos os segmentos.

A outra parte da nossa estratégia é a renovação e reorganização de toda a rede que tem de estar de acordo com o posicionamento da nossa gama. Estabelecemos uma rede de concessionários e estações dedicadas à gama de pesados um pouco por toda a Europa que é capaz de atender e oferecer um serviço altamente profissional aos clientes e ainda maximizar o rendimento dos seus veículos. Tudo isto está a funcionar na perfeição.

Também estamos atentos à situação da nossa qualidade percebida, que tem vindo a melhorar bastante

Por fim, a conetividade que vai ter um papel de enorme protagonismo na forma como vamos fornecer aos nossos clientes o melhor TCO e a melhor gestão de frotas. Já temos a infraestrutura de produtos e vamos lançar cada vez mais e melhor conetividade, aumentando os benefícios para os nossos clientes.

Fundamentalmente, o Transform2Win vai criar uma empresa sempre em movimento focada em camiões e motores e baseada na sólida estratégia que a Iveco tem perseguido nos últimos anos. E a crise não nos vai parar. Tal como dizemos na nossa marca “Somos Imparáveis”, e a Covid-19 não nos vai parar!

2 – (C&P) Uma das prioridades da Iveco é o reposicionamento dos camiões. Será o novo S-WAY, tanto a gasóleo como a gás natural, o produto certo para se atingir este objetivo? Porquê? Que “feedback”têm recebido até agora dos clientes Iveco por toda a Europa?

(TH)  – Claro que o Iveco S-WAY é o produto certo. O “feedback” que estamos a receber dos clientes diz-nos isso mesmo. Vêem o progresso nas propostas de veículos da Iveco. Frotas enormes que compraram outras marcas estão agora a mudar para a Iveco por duas razões: gostam do Iveco S-WAY, o conceito de produto, a cabina, que está entre as melhores, e o seu aspeto apelativo. A segunda razão é o facto de sermos líderes na tecnologia GNL, solução na qual somos pioneiros e que desenvolvemos há 20 anos.

Os nossos condutores também gostam muito do S-WAY. Falam muito do tema nas redes sociais, onde são particularmente ativos.

Por isso, todas estas respostas são o testemunho de que estamos no caminho certo. E tudo isto é confirmado pela nossa quota de mercado: antes da crise, nos primeiros três meses de 2020, aumentamos a nossa quota no mercado europeu em cerca de 2%. É uma conquista remarcável num segmento tão competitivo. E isto é apenas o início, porque o S-WAY ainda está em fase de lançamento.

A nossa segunda geração de veículos GNL está a chegar, trazendo melhorias em modelos como o Stralis GNL. Este ano também lançamos a versão de volante à direita do S-WAY, completando a família.

Felizmente conseguimos completar o lançamento de toda a gama S-WAY antes da crise da Covid-19, até porque para os nossos clientes era essencial experimentarem e testarem os camiões em primeira mão, sentarem-se atrás do volante e perceberem o que temos ali. Os nossos motoristas vivem no camião! E pudemos oferecer-lhes a seguinte experiência: organizamos cerca de 130 eventos um pouco por toda a Europa, com cerca de 20 mil convidados, o que agora seria impossível. E assim que a situação o permitir, vamos continuar a mostrar o S-WAY e a conquistar clientes e fãs.

3 – (C&P) E sobre o bio-GNL? É a solução certa para gerir a transição do Diesel para os camiões BEV ou FECV?

(TH) – Acredito que o bio-GNL será o foguetão que vai permitir alcançar a lua, não sei se me faço entender. É o único combustível de emissões zero atualmente disponível no mercado. Nos últimos dois anos vimos cerca de 2,5% do mercado fazer a transição para a tecnologia GNL, e acredito que vai subir para 5% a médio prazo e para 10% nos próximos 10 anos.

A faísca para este crescimento será, com toda a certeza, a expansão das infraestruturas de abastecimento de GNL por toda a Europa: atualmente existem 217 postos de abastecimento e o objetivo é chegar aos 480.
É absolutamente evidente que dentro de 10 anos existirão mais opções para os camiões: não será apenas o gasóleo, ou só o hidrogénio ou só o GNL. Existirão diferentes soluções na Europa, dependendo das diferentes aplicações do cliente e nas opções que os clientes e os países vão tomar.

Os camiões 100% elétricos farão parte de um segmento pequeno e o hidrogénio terá um papel importante – não há dúvidas de que será o futuro. E existirá um mercado para o GNL e não é apenas para fazer a ponte. Continuará a ser um alternativa válida, propondo um pacote comercial muito interessante.

O bio-GNL vai fazer uma grande diferença quando chegar ao mercado. Nos últimos seis meses temos visto empresas de energia e eletricidade fazerem anúncios tais como a Shell que já declarou os seus planos para o bio-GNL que deverá representar 30% da fornecimento de GNL da empresa.

É muito importante perceber que foram vários os clientes que desenvolveram as suas próprias fonte de bio-GNL. Por exemplo, estão a nascer em Itália em grande número pequenos produtores de bio-GNL, em Espanha e na Alemanha, que oferecem aos clientes a possibilidade de operarem os seus veículos com este tipo de combustível produzindo menos 95% de emissões que um Diesel e, para já, ao mesmo preço. Isto faz toda a diferença: empresas com o Lidl ou o Carrefour, tal como produtores de bebidas querem expandir a suas frotas e fazem questão de frisar que o bio-GNL é a única solução.

4 – (C&P) A Iveco e a FPT Industrial apostou em motores a gás já lá vão 20 anos. Como planeiam tirar todos os dividendos do facto da tecnologia GNL da Iveco ser líder nos maiores mercados europeus? Pretendem mostrar aos clientes que o GNL é melhor (ou igual) a um camião a gasóleo?

(TH) – Antevejo uma total mudança na mente dos nossos clientes. Já não precisamos de os convencer das vantagens económicas e ambientais do Gás Natural, eles já as conhecem e vêem ter connosco.

Acredito que a transição pós Covid-19 vai acelerar este processo. Acredito que é a oportunidade que precisavamos para investor em tecnologia e em processos que nos vão levar ao futuro. Na Iveco estamos a trabalhar arduamente com as associações automóveis e com os governos para nos assegurarmos que utilizamos a crise como um acelerador para estas tecnologias.

Vamos tirar partido total desta oportunidade e no final de 2020 vamos aumentar o nosso portfolio de produtos através da parceria com a Nikola, com um camião elétrico, ao qual se segue o lançamento de um veículo a hidrogénio.

5 – (C&P) Se olhar para os resultados da Iveco no ultimo ano nos principais mercados europeus, como os julgaria?

(TH) – Alcançamos excelentes resultados, disso não temos dúvidas. A Iveco vendeu 125 mil veículos dos quais cerca de 100 mil foram no Velho Continente.

Estamos muito bem no segmento da Daily, onde somos líderes de mercado há 40 anos. Com uma quota de mercado em torno dos 12%, estamos em excelente posição num segmento que está em constante crescimento e desenvolvimento. No pós Covid-19, veremos uma alteração no comportamento dos nossos clientes que tem a ver com a utilização da internet e da digitalização e a Daily está muito bem posicionada para ir ao encontro destes novos padrões com a sua conetividade avançada e todos os restante negócios relacionados. Também acredito que o segmento da última milha vai crescer muito em breve, e nós estamos numa posição muito confortável para ir ao encontro desta procura.

O Eurocargo mantêm-se como um excelente produto, muito versátil e acredito que vai manter esta posição em aplicações específicas como serviços públicos e ambientes militares.

O nosso sucesso vai depender do S-WAY e do T-WAY. Temos 6% de quota de mercado no segmento pesado e conseguimos chegar aos 8% em fevereiro deste ano. Acredito que o ano de 2019 foi o ano da mudança para nós e 2020 será o acelerador quando sairmos da situação da Covid-19. Estou muito entusiasmado com o lançamento do T-WAY no final deste ano.

6 – (C&P) Pode dar-nos a sua visão para este ano, apesar da quebra da atividade económica causada pela pandemia. Há alguma forma de perceber como o mercado vai recuperar quando a pandemia terminar?

(TH) – Vai claramente depender do trilho percorrido pela infeção, mas todo queremos que os efeitos sejam reduzidos e de curto prazo. Como as coisas estão agora, acredito que o mercado vá cair entre 30 a 35% quando comparado com o ano passado, mas acredito que quando os vários pacotes governamentais forem aprovados, o mercado vai recuperar. Não creio que vamos testemunhar o que aconteceu em 2009, com a crise Lehman. O sistema bancário tem atualmente mais saúde e os governos estão a reagir rapidamente. Para a Iveco, nós sabemos o que fazer, aprendemos muito com a última crise, por isso estou confiante.

7 – (C&P) Como está a Iveco a apoiar os seus clientes, as vendas e a rede nestes tempos difíceis?

(TH) – Os nossos clientes estão a sofrer neste momento, estão a braços com desafios muito complicados tais como obrigações ao nível da saúde pública e obrigações de segurança, e os seus motoristas expostos porque continuam a conduzir e a atravessar países fortemente afetados pela pandemia e controlos fronteiriços.
Vamos fazer tudo para nos mantermos perto deles e para os encorajar. Estamos muito orgulhosos dos motoristas e dos nossos mecânicos que estão a manter as oficinas abertas para fornecer um serviço vital. Todas as pessoas que estão a trabalhar para assegurar a vitalidade dos nossos clientes têm o nosso apoio. Estamos muito agradecidos a cada pessoa que continua a trabalhar na linha da frente nestes tempos desafiantes.

Estamos ainda a trabalhar em parceria com as Associações Europeias de Concessionários, a Gacie, para garantir que as nossas concessões tenham dinheiro para sairem desta situação. A situação varia, até porque os países são afetados de formas distintas e têm leis diferentes, por isso estamos à procura de soluções país a país.

Acredito que, como marca, em tempos difíceis como estes temos de estar lá para os nossos clientes e parceiros. É isto que faz de nós uma grande marca e nós pretendemos sê-lo.

8 – (C&P) Qual a importância da conetividade e todos os serviços com ela relacionados propostos pela nova gama de produtos da Iveco?

(TH) – Temos de montar a nossa oferta da perspetiva do cliente e que estas funcionalidades maximizem o seu tempo de trabalho e reduzam os custos operacionais. Temos de estar presentes como parceiro e isto não pode ser feito sem serviços profissionais e de alta qualidade. É por isso que nos últimos 18 meses reformulámos totalmente toda a infraestrutura de comunicação dos nossos veículos. Agora propomos tecnologia de ponta com mais serviços que acrescentam valor aos nossos clientes.

Isto inclui a nossa manutenção flexível e os respetivos contratos, mas também outros serviços interessantes, tal como alertas de consumo e de combustível que ajudam os nossos clientes a reduzir os consumos dos seus veículos. Podemos dizer-lhes como se estão a comportar os seus motoristas em termos de consumos e dar-lhes recomendações para melhorarem.

9 – (C&P) E no que diz respeito à parceria da Nikola com a Iveco: Pode resumir os próximos passos no lançamento de camiões BEV e FCEV no mercado?

(TH) – Covid-19 não nos parou. Estamos a trabalhar de acelerador a fundo com os nossos parceiros americanos. Felizmente, a tecnologia de comunicação avançada torna isto possível, por isso não estamos a abrandar.

Esperamos poder começar a testar no final deste ano. Comunicamos recentemente o local de produção do Nikola Tre na Europa. Será em Ulm, na Alemanha. Para mim, isto é um passo inteligente: é no centro de todos os fornecedores principais na cadeia do hidrogénio e num estado da Alemanha que oferece vários apoios neste âmbito. Temos ainda uma grande parte da nossa equipa de desenvolvimento de camiões em Ulm.

Agora estamos a trabalhar no desenvolvimento técnico deste veículo. Estamos num estágio muito avançado e a definir tudo para que a versão elétrica do Tre seja lançada em 2021 e a versão a célula de combustível em 2023. Por isso não mudamos nada, somos imparáveis!

10 – (C&P) Os camiões BEV e FCEV serão comercializados pela rede Iveco sob a marca Nikola. Como vai o mercado reagir?

(TH) – Penso que o mercado vai reagir de uma forma muito positive, porque são dois parceiros com sinergias muito significativas. A Nikola é líder de mercado na tecnologia “Fuel Cell” para camiões, por isso estamos muito confiantes no facto de termos encontrado este parceiro. Por outro lado, estamos dispostos a contribuir com 45 anos de experiência em produção de veículos, desenvolvimentos e testes de camiões na Europa.

Ricardo Carvalho

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